"O hotel foi chumbado porque as torneiras dos bidés não eram misturadoras. A classificação não foi aprovada porque a comida era servida em pratos e não em travessas. O processo veio para trás porque o hotel de praia não tinha bengaleiros, como manda a lei. São histórias reais 'e que fazem parte do nosso anedotário, por vezes rimo-nos com elas', refere Jorge Rebelo de Almeida, presidente do grupo Vila Galé. Mas os empresários não acham graça nenhuma ao facto de terem de desenvolver os seus negócios com 'regras tontas e disparatadas', que levam os projectos a ficar na gaveta ao longo de dez e vinte anos, empatados numa teia de burocracia que envolve um batalhão de funcionários de 16 corredores da Administração Pública. Nesta via-sacra, muitos investidores acabam por desistir.
'As regras são tão complicadas que ninguém as consegue cumprir', salienta José Carlos Pinto Coelho, presidente da Confederação do Turismo Português, a propósito do Decreto-Lei 167/97, que regula o licenciamento e o funcionamento dos empreendimentos turísticos. 'Se fôssemos a cumprir em Portugal tudo o que está na lei, seria a 'débacle' total. Cumprem-se os aspectos mais lógicos e vai-se empurrando com a barriga para a frente', adianta outro responsável do sector, referindo que 'há formatos hoteleiros na Europa que não podem existir em Portugal segundo a lei em vigor'.
Mas os empresários acreditam que a era de policiar a actividade ao milímetro, que já vem do tempo de Salazar (que chamava a si próprio a tarefa de despachar os hotéis), está mesmo a chegar ao fim. A lei dos empreendimentos turísticos entrou na recta final de revisão, e a última reunião do Governo com as associações foi marcada por um 'casamento de ideias' relativamente ao futuro rumo das regras. 'A reunião foi uma boa surpresa. Sente-se um menor poder da tecnoestrutura governamental e uma vontade de caminhar no sentido de consensos', adianta fonte da Confederação do Turismo, advertindo que os privados, apesar de concordarem no essencial com a 'lei mãe' proposta pelo Governo, precisam ainda de conhecer o conteúdo dos respectivos diplomas regulamentares.
'O grande problema do turismo em Portugal não é a carga fiscal ou o despropósito da legislação laboral, mas a forma como os licenciamentos se desenvolvem', sublinhou Jorge Rebelo de Almeida numa conferência sobre a matéria promovida pela Associação dos Hotéis de Portugal, que faz apelo a 'mais regulação e menos regulamentação' por parte do Estado. 'A solução passa por desburocratizar as cabeças. A administração pública não pode continuar a tratar os investidores como bandidos e vigaristas. Quem está com a responsabilidade de aprovar qualquer coisa corre o risco de levantar suspeições de estar feito com os promotores pelo simples facto de dizer que sim. Esta mentalidade tem de acabar.'
Sistema PIN é 'injusto'
Para simplificar as aprovações e reduzir os tempos de espera, Segurança e Ambiente deveriam ser os únicos aspectos salvaguardados na lei 'e tudo o resto deixado à iniciativa dos empresários', defendeu Castelão Costa, administrador do Grupo Pestana. 'Se entendermos que não deve haver ar condicionado devido ao tipo de construção, se as casas de banho devem ou não ter bidés, ou se os telefones estão na secretária e não na mesa-de-cabeceira, é porque esta é uma tendência do mercado e o Estado não se deve meter. Hoje, ou somos diferentes, ou já não é possível competir com mais do mesmo em hotelaria'. Rebelo de Almeida defende que o Ambiente deve ser uma prioridade na legislação turística. 'Mesmo com excessivas regulamentações, têm aparecido uns 'masmorros' um pouco por todo o lado'otéis de Po.
O empresário classificou ainda como 'injusto' o modelo de 'aprovação acelerada' dos projectos PIN (de Potencial Interesse Nacional), considerados como 'via verde' dos projectos turísticos. 'A existência dos PIN é a confirmação de que o próprio sistema não funciona', sustentou na ocasião Jorge Gonçalves, advogado ligado à imobiliária turística, chamando a atenção para o facto de a actual lei contemplar 'modelos que os investidores estrangeiros pura e simplesmente não entendem e que não existem em mais lado nenhum'. Jorge Umbelino, vice-presidente do Turismo de Portugal, salientou que 'não é fácil para a administração' lidar com a questão dos licenciamentos e que 'nã há pessoas sádicas com uma lista à espera de encontrar erros'.
Segundo Cristina Siza Vieira, ex-responsável da Direcção-Geral do Turismo, a revisão da lei dos empreendimentos decorre 'num momento histórico com um grãozinho de sal, e é uma oportunidade única para simplificação legislativa ao coincidir com programas do Estado como o PRACE ou o Simplex.' Para Henrique Veiga, presidente da Associação dos Hotéis de Portugal, há que 'aproveitar esta conjugação astral para ir fundo nas mudanças, ou perderemos um 'timing' que não se repetirá'. Lembrando que a actual lei carrega consigo o fardo de corrigir os excessos de betão dos anos 80, Henrique Veiga faz apelo a 'uma psicanálise colectiva' para o país poder dar o salto para o século XXI. 'Não podemos é continuar a discutir filosoficamente as questões do turismo. Já passou tempo de mais.
Alojamento local resolve ilegais
Uma das novidades da lei dos empreendimentos turísticos que está a ser revista é a criação do 'alojamento local', que visa encontrar uma solução para o problema das camas ilegais, que atinge destinos de forte sazonalidade, como Algarve ou Fátima. Segundo a proposta do Governo avançada às associações, o conceito de 'alojamento local' refere-se a 'estabelecimentos de hospedagem ocasionalmente utilizados por turistas, mediante remuneração, com prestação de serviços associados', cabendo a sua regulamentação às assembleias municipais.
A Confederação do Turismo Português contestou fortemente esta solução, que liberta o alojamento local do cumprimento das regras a que estão sujeitos os restantes empreendimentos. 'Não queremos um alojamento local regulado pelas câmaras. Significaria ter 300 regulamentos diferentes em Portugal. E prezamos muito a igualdade de condições de concorrência', frisa um responsável da Confederação do Turismo, defendendo que a lei deve ser corrigida no sentido de enquadrar empreendimentos 'de grande categoria', actualmente considerados como camas ilegais por falta de solução legal. 'Há casas na Quinta do Lago comercializadas a 5 mil euros por dia, com piscina, sauna e mordomo. E basta não terem um sistema de detecção de incêndios para não poderem ser consideradas oferta turística', faz notar.
A questão do alojamento local este à mesa na última reunião entre o Governo e os privados, que resultou 'num grande consenso' no sentido de encontrar 'regras transversais' para regular este tipo de estabelecimentos. A reunião foi também consensual numa série de matérias onde havia fortes reservas das associações. Entre estas, destaca-se o artigo 48º da proposta de decreto-lei do Governo (relativo à exploração turística das unidades de alojamento), impondo um ónus de utilização por parte do proprietário a 90 dias por ano, regra a aplicar em 70% dos hotéis-apartamentos e 35% dos 'resorts' integrados. As associações consideram que este ónus não faz sentido, pois 'a duração das estadias é variável ao longo do ciclo de vida do proprietário-utilizador', e defendem que os alojamentos devem estar 100% afectos à exploração turística." (Conceição Antunes - Expresso, 27/10/2007)
'As regras são tão complicadas que ninguém as consegue cumprir', salienta José Carlos Pinto Coelho, presidente da Confederação do Turismo Português, a propósito do Decreto-Lei 167/97, que regula o licenciamento e o funcionamento dos empreendimentos turísticos. 'Se fôssemos a cumprir em Portugal tudo o que está na lei, seria a 'débacle' total. Cumprem-se os aspectos mais lógicos e vai-se empurrando com a barriga para a frente', adianta outro responsável do sector, referindo que 'há formatos hoteleiros na Europa que não podem existir em Portugal segundo a lei em vigor'.
Mas os empresários acreditam que a era de policiar a actividade ao milímetro, que já vem do tempo de Salazar (que chamava a si próprio a tarefa de despachar os hotéis), está mesmo a chegar ao fim. A lei dos empreendimentos turísticos entrou na recta final de revisão, e a última reunião do Governo com as associações foi marcada por um 'casamento de ideias' relativamente ao futuro rumo das regras. 'A reunião foi uma boa surpresa. Sente-se um menor poder da tecnoestrutura governamental e uma vontade de caminhar no sentido de consensos', adianta fonte da Confederação do Turismo, advertindo que os privados, apesar de concordarem no essencial com a 'lei mãe' proposta pelo Governo, precisam ainda de conhecer o conteúdo dos respectivos diplomas regulamentares.
'O grande problema do turismo em Portugal não é a carga fiscal ou o despropósito da legislação laboral, mas a forma como os licenciamentos se desenvolvem', sublinhou Jorge Rebelo de Almeida numa conferência sobre a matéria promovida pela Associação dos Hotéis de Portugal, que faz apelo a 'mais regulação e menos regulamentação' por parte do Estado. 'A solução passa por desburocratizar as cabeças. A administração pública não pode continuar a tratar os investidores como bandidos e vigaristas. Quem está com a responsabilidade de aprovar qualquer coisa corre o risco de levantar suspeições de estar feito com os promotores pelo simples facto de dizer que sim. Esta mentalidade tem de acabar.'
Sistema PIN é 'injusto'
Para simplificar as aprovações e reduzir os tempos de espera, Segurança e Ambiente deveriam ser os únicos aspectos salvaguardados na lei 'e tudo o resto deixado à iniciativa dos empresários', defendeu Castelão Costa, administrador do Grupo Pestana. 'Se entendermos que não deve haver ar condicionado devido ao tipo de construção, se as casas de banho devem ou não ter bidés, ou se os telefones estão na secretária e não na mesa-de-cabeceira, é porque esta é uma tendência do mercado e o Estado não se deve meter. Hoje, ou somos diferentes, ou já não é possível competir com mais do mesmo em hotelaria'. Rebelo de Almeida defende que o Ambiente deve ser uma prioridade na legislação turística. 'Mesmo com excessivas regulamentações, têm aparecido uns 'masmorros' um pouco por todo o lado'otéis de Po.
O empresário classificou ainda como 'injusto' o modelo de 'aprovação acelerada' dos projectos PIN (de Potencial Interesse Nacional), considerados como 'via verde' dos projectos turísticos. 'A existência dos PIN é a confirmação de que o próprio sistema não funciona', sustentou na ocasião Jorge Gonçalves, advogado ligado à imobiliária turística, chamando a atenção para o facto de a actual lei contemplar 'modelos que os investidores estrangeiros pura e simplesmente não entendem e que não existem em mais lado nenhum'. Jorge Umbelino, vice-presidente do Turismo de Portugal, salientou que 'não é fácil para a administração' lidar com a questão dos licenciamentos e que 'nã há pessoas sádicas com uma lista à espera de encontrar erros'.
Segundo Cristina Siza Vieira, ex-responsável da Direcção-Geral do Turismo, a revisão da lei dos empreendimentos decorre 'num momento histórico com um grãozinho de sal, e é uma oportunidade única para simplificação legislativa ao coincidir com programas do Estado como o PRACE ou o Simplex.' Para Henrique Veiga, presidente da Associação dos Hotéis de Portugal, há que 'aproveitar esta conjugação astral para ir fundo nas mudanças, ou perderemos um 'timing' que não se repetirá'. Lembrando que a actual lei carrega consigo o fardo de corrigir os excessos de betão dos anos 80, Henrique Veiga faz apelo a 'uma psicanálise colectiva' para o país poder dar o salto para o século XXI. 'Não podemos é continuar a discutir filosoficamente as questões do turismo. Já passou tempo de mais.
Alojamento local resolve ilegais
Uma das novidades da lei dos empreendimentos turísticos que está a ser revista é a criação do 'alojamento local', que visa encontrar uma solução para o problema das camas ilegais, que atinge destinos de forte sazonalidade, como Algarve ou Fátima. Segundo a proposta do Governo avançada às associações, o conceito de 'alojamento local' refere-se a 'estabelecimentos de hospedagem ocasionalmente utilizados por turistas, mediante remuneração, com prestação de serviços associados', cabendo a sua regulamentação às assembleias municipais.
A Confederação do Turismo Português contestou fortemente esta solução, que liberta o alojamento local do cumprimento das regras a que estão sujeitos os restantes empreendimentos. 'Não queremos um alojamento local regulado pelas câmaras. Significaria ter 300 regulamentos diferentes em Portugal. E prezamos muito a igualdade de condições de concorrência', frisa um responsável da Confederação do Turismo, defendendo que a lei deve ser corrigida no sentido de enquadrar empreendimentos 'de grande categoria', actualmente considerados como camas ilegais por falta de solução legal. 'Há casas na Quinta do Lago comercializadas a 5 mil euros por dia, com piscina, sauna e mordomo. E basta não terem um sistema de detecção de incêndios para não poderem ser consideradas oferta turística', faz notar.
A questão do alojamento local este à mesa na última reunião entre o Governo e os privados, que resultou 'num grande consenso' no sentido de encontrar 'regras transversais' para regular este tipo de estabelecimentos. A reunião foi também consensual numa série de matérias onde havia fortes reservas das associações. Entre estas, destaca-se o artigo 48º da proposta de decreto-lei do Governo (relativo à exploração turística das unidades de alojamento), impondo um ónus de utilização por parte do proprietário a 90 dias por ano, regra a aplicar em 70% dos hotéis-apartamentos e 35% dos 'resorts' integrados. As associações consideram que este ónus não faz sentido, pois 'a duração das estadias é variável ao longo do ciclo de vida do proprietário-utilizador', e defendem que os alojamentos devem estar 100% afectos à exploração turística." (Conceição Antunes - Expresso, 27/10/2007)
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