"PÚBLICO - A estratégia de ordenamento do território e de política ambiental no Algarve está a ser a correcta?
Hélder Martins - É moda bater no Algarve, e vejo até autarcas em zonas do país que são os piores exemplos a dizerem que não querem fazer uma Quarteira. Bastava que tivessem um espelho, para perceberem que têm situações muito piores. Mas o Algarve tem vários sítios muito difíceis de resolver: Praia da Rocha, Armação de Pêra, Quarteira, Monte Gordo. Sendo certo que não temos dinheiro nem coragem para deitar prédios abaixo - há alguns prédios parados há vários anos, sem estarem acabados, e que não conseguimos acabar -, a aposta das câmaras municipais é melhorar a envolvente, as acessibilidades, os espaços verdes. Em relação ao resto do Algarve, creio que não há uma calamidade.
E qual é a análise que faz do novo Protal (Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve)?
Pelo que conheço, resolve alguns problemas e não resolve outros. Se quiséssemos fazer outra Quinta do Lago, onde é que fazíamos? O Protal não tem solução para isso. Mas alguma restrição que faz na zona em cima do mar poderá obrigar a uma coisa fundamental: pegar em hotéis que estão há 30 ou 40 anos construídos e remodelá-los. O caso do Atlantis, em Vilamoura, é um exemplo. O hotel foi comprado, vai ser alvo de uma remodelação e vai ser um projecto de alta qualidade. Temos vários hotéis na orla costeira, em cima do mar, em que, se calhar, a solução era demolir e fazer lá um espaço novo. No Protal e nos PDM (planos directores municipais) que aí vêm, há ainda um grande problema, que são os direitos adquiridos. Esse é que é o grande problema do Algarve: o número de camas aprovadas, algumas delas há mais de 20 anos...
Quantas são?
Não sei, uma vez sugeri que se fizesse esse estudo na CCDR (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional). Em relação às que foram aprovadas há muitos anos, a realidade não é a mesma de hoje. Acho que está mal que alguém tenha um alvará vitalício a dizer que pode fazer vários prédios com 10 andares.
Em alguns casos, estamos a falar não de direitos adquiridos, mas de expectativas de direitos adquiridos.
Sim, mas se tiver um alvará de loteamento é um direito adquirido. Eu, na câmara [de Loulé], tentei negociar com um privado que queria fazer um prédio de dez andares em Quarteira. E, no executivo (sete pessoas, dois partidos), disseram que não se podia. E o homem chegou e eu disse que a câmara não via com bons olhos e que o melhor era ele fazer com seis andares, como está no PDM. Ele perguntou-me se o indemnizava. Não indemnizando, se não aprovava comigo aprovaria com outro. E ele há-de fazer os dez andares e há-de vendê-los. Esse é que é o mal. E estamos a falar de andares que são utilizados 15 dias no Verão ou estão no mercado paralelo do arrendamento.
Estamos a alimentar apenas a especulação?
Em Espanha, em Palma de Maiorca, há uma presidente de câmara que implodiu 18 edifícios, todos torres acima do mar, e no seu lugar fez acessos às praia, áreas públicas, estacionamento. Bom, perdeu as eleições a seguir. E esse é um problema. Mas ela conseguiu implodir 18 edifícios, nós não o conseguimos, não temos dinheiro para o pagar nem coragem para o fazer. Grande parte destes apartamentos vai parar às camas paralelas, que têm um impedimento que bloqueia tudo - a começar pelos grandes empreendimentos. Ninguém consegue legalizar uma moradia no Vale de Lobo, na Quinta do Lago ou onde quer que seja, que foi aprovada com um alvará que diz habitação própria.
Existe pressão das imobiliárias para que haja mais construção no Algarve. Corre-se o risco de repetir o modelo espanhol?
Não tenho dúvidas de que não. Nunca chegaremos ao que existe do outro lado da fronteira, com o actual regime de ordenamento. Volto a sublinhar que há aqui um problema das coisas decididas nos anos 80, mas são coisas de outra dimensão. Já não diria que [os alvarás] fossem extintos, era que fosse dado um prazo. Ter um alvará aprovado há 20 anos e continuar a ser viável construir o que era na altura aprovado, é um perigo. Portanto, o negócio é adquirir um alvará, não construir um loteamento e vender o próprio alvará. É evidente que estes alvarás de que estamos a falar são de loteamento.
Mas pode vender esse alvará?
Claro que pode, e isso vale dinheiro. E como continua a haver clientes para comprar esse produto... Se não houvesse clientes, era diferente.
Mas veja isso pelo lado contrário. A procura que hoje há no Algarve por empreendimentos de grande qualidade é maior do que nunca. Finalmente vai haver Hilton, vai haver um conjunto de marcas de grande prestígio. Quando estas empresas escolhem o Algarve, é porque fizeram um estudo e verificaram que o seu produto e o seu cliente se enquadram perfeitamente ali.
Um dos segmentos em expansão é o turismo cultural. O Algarve perdeu alguns dos grandes acontecimentos, como a realização do festival internacional de música. Nessa área, qual é o papel da região de turismo?
A região de turismo era vista como uma entidade para pagar. Não somos nós que somos insensíveis culturais, temos é de pensar: dos 250 mil euros que custava normalmente o festival de música, qual era o retorno do turismo? E dos 250 mil euros que custava normalmente o Cross das Amendoeiras, qual era o retorno do turismo? Se calhar, tinha retorno em termos desportivos, mas em termos turísticos não tinha. Por outro lado, queremos substituir o festival de música por um festival de música contemporânea, que leva só numa edição mais gente do que todos os outros. Quem quer que venha a seguir, manterá ou não esta política.
Isso é já um discurso de despedida?
Sempre tive a visão de que os mandatos são para cumprir e são períodos de quatro anos. Esse período termina agora. Não escondo que correu bem, mas nunca vivi numa perspectiva de que tenho de fazer tudo agora para garantir votos a seguir. Cumprirei o mandato até ao fim e depois logo veremos. Primeiro, ainda não conheço a nova lei das regiões de turismo. E depois, acho que há vida para além da política... É certo que será antes do Verão que vamos definir se nos recandidatamos." (Idálio Revez e Inês Sequeira - Público, 05/02/2007)
Hélder Martins - É moda bater no Algarve, e vejo até autarcas em zonas do país que são os piores exemplos a dizerem que não querem fazer uma Quarteira. Bastava que tivessem um espelho, para perceberem que têm situações muito piores. Mas o Algarve tem vários sítios muito difíceis de resolver: Praia da Rocha, Armação de Pêra, Quarteira, Monte Gordo. Sendo certo que não temos dinheiro nem coragem para deitar prédios abaixo - há alguns prédios parados há vários anos, sem estarem acabados, e que não conseguimos acabar -, a aposta das câmaras municipais é melhorar a envolvente, as acessibilidades, os espaços verdes. Em relação ao resto do Algarve, creio que não há uma calamidade.
E qual é a análise que faz do novo Protal (Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve)?
Pelo que conheço, resolve alguns problemas e não resolve outros. Se quiséssemos fazer outra Quinta do Lago, onde é que fazíamos? O Protal não tem solução para isso. Mas alguma restrição que faz na zona em cima do mar poderá obrigar a uma coisa fundamental: pegar em hotéis que estão há 30 ou 40 anos construídos e remodelá-los. O caso do Atlantis, em Vilamoura, é um exemplo. O hotel foi comprado, vai ser alvo de uma remodelação e vai ser um projecto de alta qualidade. Temos vários hotéis na orla costeira, em cima do mar, em que, se calhar, a solução era demolir e fazer lá um espaço novo. No Protal e nos PDM (planos directores municipais) que aí vêm, há ainda um grande problema, que são os direitos adquiridos. Esse é que é o grande problema do Algarve: o número de camas aprovadas, algumas delas há mais de 20 anos...
Quantas são?
Não sei, uma vez sugeri que se fizesse esse estudo na CCDR (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional). Em relação às que foram aprovadas há muitos anos, a realidade não é a mesma de hoje. Acho que está mal que alguém tenha um alvará vitalício a dizer que pode fazer vários prédios com 10 andares.
Em alguns casos, estamos a falar não de direitos adquiridos, mas de expectativas de direitos adquiridos.
Sim, mas se tiver um alvará de loteamento é um direito adquirido. Eu, na câmara [de Loulé], tentei negociar com um privado que queria fazer um prédio de dez andares em Quarteira. E, no executivo (sete pessoas, dois partidos), disseram que não se podia. E o homem chegou e eu disse que a câmara não via com bons olhos e que o melhor era ele fazer com seis andares, como está no PDM. Ele perguntou-me se o indemnizava. Não indemnizando, se não aprovava comigo aprovaria com outro. E ele há-de fazer os dez andares e há-de vendê-los. Esse é que é o mal. E estamos a falar de andares que são utilizados 15 dias no Verão ou estão no mercado paralelo do arrendamento.
Estamos a alimentar apenas a especulação?
Em Espanha, em Palma de Maiorca, há uma presidente de câmara que implodiu 18 edifícios, todos torres acima do mar, e no seu lugar fez acessos às praia, áreas públicas, estacionamento. Bom, perdeu as eleições a seguir. E esse é um problema. Mas ela conseguiu implodir 18 edifícios, nós não o conseguimos, não temos dinheiro para o pagar nem coragem para o fazer. Grande parte destes apartamentos vai parar às camas paralelas, que têm um impedimento que bloqueia tudo - a começar pelos grandes empreendimentos. Ninguém consegue legalizar uma moradia no Vale de Lobo, na Quinta do Lago ou onde quer que seja, que foi aprovada com um alvará que diz habitação própria.
Existe pressão das imobiliárias para que haja mais construção no Algarve. Corre-se o risco de repetir o modelo espanhol?
Não tenho dúvidas de que não. Nunca chegaremos ao que existe do outro lado da fronteira, com o actual regime de ordenamento. Volto a sublinhar que há aqui um problema das coisas decididas nos anos 80, mas são coisas de outra dimensão. Já não diria que [os alvarás] fossem extintos, era que fosse dado um prazo. Ter um alvará aprovado há 20 anos e continuar a ser viável construir o que era na altura aprovado, é um perigo. Portanto, o negócio é adquirir um alvará, não construir um loteamento e vender o próprio alvará. É evidente que estes alvarás de que estamos a falar são de loteamento.
Mas pode vender esse alvará?
Claro que pode, e isso vale dinheiro. E como continua a haver clientes para comprar esse produto... Se não houvesse clientes, era diferente.
Mas veja isso pelo lado contrário. A procura que hoje há no Algarve por empreendimentos de grande qualidade é maior do que nunca. Finalmente vai haver Hilton, vai haver um conjunto de marcas de grande prestígio. Quando estas empresas escolhem o Algarve, é porque fizeram um estudo e verificaram que o seu produto e o seu cliente se enquadram perfeitamente ali.
Um dos segmentos em expansão é o turismo cultural. O Algarve perdeu alguns dos grandes acontecimentos, como a realização do festival internacional de música. Nessa área, qual é o papel da região de turismo?
A região de turismo era vista como uma entidade para pagar. Não somos nós que somos insensíveis culturais, temos é de pensar: dos 250 mil euros que custava normalmente o festival de música, qual era o retorno do turismo? E dos 250 mil euros que custava normalmente o Cross das Amendoeiras, qual era o retorno do turismo? Se calhar, tinha retorno em termos desportivos, mas em termos turísticos não tinha. Por outro lado, queremos substituir o festival de música por um festival de música contemporânea, que leva só numa edição mais gente do que todos os outros. Quem quer que venha a seguir, manterá ou não esta política.
Isso é já um discurso de despedida?
Sempre tive a visão de que os mandatos são para cumprir e são períodos de quatro anos. Esse período termina agora. Não escondo que correu bem, mas nunca vivi numa perspectiva de que tenho de fazer tudo agora para garantir votos a seguir. Cumprirei o mandato até ao fim e depois logo veremos. Primeiro, ainda não conheço a nova lei das regiões de turismo. E depois, acho que há vida para além da política... É certo que será antes do Verão que vamos definir se nos recandidatamos." (Idálio Revez e Inês Sequeira - Público, 05/02/2007)
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